DE QUE VOCÊ TEM MEDO?
O medo, sentimento nato de toda espécie viva. Útil para a defesa de situações perigosas. Quem atravessa uma rua sem medo, tem o risco de ser atropelado, isso porque o medo desperta e acentua a sensibilidade e reações, como por exemplo o reflexo, sem o qual não nos esquivaria de algo que fosse lançado contra nós, mas até aonde o medo é benéfico? O ser humano tem uma peculiaridade ao lidar com o medo, pois não nos restringimos somente ao medo do real, mas também de nossas próprias fantasias.
Ao pensarmos em uma suposta situação, analisamos todas as variáveis do que poderá ocorrer e conforme o que imaginarmos, é possível não enfrentarmos a situação, o que é bem diferente do que ocorre com os animais, que vivem cada momento e analisam o risco com sua capacidade sensorial, trocando por outras palavras, vivem o aqui e agora.
Nós nascemos com a mesma capacidade de viver cada momento de uma vez e intensamente, mas vamos nos afastando de nossa sensorialidade. O medo é uma parte essencial para avaliação de quanto podemos realizar, se podemos enfrentar ou evitar o que nos ameaça de verdade. A partir da neurotização da sociedade, e esse começo se perde na história da humanidade, foi introduzida a fantasia na psiquê humana. Se fizermos um paralelo com o mundo da informática, as cenas são virtuais mas vivemos como sendo reais e nossas reações vegetativas assim demonstram: mãos suadas, coração palpitando, pupila dos olhos dilatada, frio na barriga, inegavelmente reações de medo, muito comum quando se vê um filme de suspense ou quando temos que passar por uma prova decisiva.
Alguns sintomas são muito comuns nos dias de hoje e fazem parte do linguajar popular, como ansiedade, síndrome do pânico, depressão, são todas variações do medo, que nesses casos tem suas causas na psiquê. Creio que as pessoas estão passando por um processo de fragilização que as tornam incapazes de enfrentar as dificuldades da vida. É certo que cada época tem seu medo, por exemplo, as guerras são momentos de extremo risco para a vida. A violência da cidade é um fator que atinge a todos, principalmente ao moradores dos grandes centros urbanos. O medo real alimenta o medo fantasioso e vice versa, quando um bandido entra em um ônibus, ele próprio tem medo, mas está contando com o medo dos passageiros que se tornam vítimas frágeis e acuadas, o que tem o medo menor vencerá os demais.
Quanto ao medo da própria fantasia, que tem suas raízes principalmente na infância, que é a época que começamos a aprender o que é perigoso e o que é prazeroso, para alguns o prazer se torna ameaçador, dependendo da educação de pais ameaçadores, que por sua vez também têm seus medos sobre o próprio corpo. Quem não viu alguma mãe repreender sua pequena filha dizendo: “menina, tira a mão daí” ou então “vou cortar seu pinto”, justamente no momento de vida que a criança está desfrutando o seu direito de reconhecer o próprio corpo, fase essencial para que tenha uma relação saudável com suas sensações. Certamente essas ameaças vão influenciar a vida sexual destas pessoas, lidando com o prazer com medo. Neste caso o medo é totalmente destrutivo, mas não o único, outras situações vão determinar o grau de coragem de uma criança. O mundo das brincadeiras é a oportunidade de se testar os próprios limites. Certamente que uma criança que está acostumada a subir em árvores será muito mais audaciosa do que uma que passa o seu tempo em frente a uma televisão ou vídeo-game.
Há casos extremos que chamamos de catatonia. Um indivíduo catatônico é uma pessoa viva, mas incapaz de lidar com o mundo a sua volta.
Vive nos seus pensamentos, como se criasse um mundo só para si. Comum em crianças com grandes traumas, estas ignoram a realidade e passam a viver exclusivamente a sua imaginação. Os extremos podem incluir o estupor catatônico, situação na qual o paciente fica imóvel por um período longo, ou o excitamento catatónico, onde o indivíduo apresenta atividade motora incontrolável e sem objetivo.O medo é um sentimento de proteção e não de auto-anulação. Vejo pessoas de grande capacidade e que não conseguem desenvolver todo o potencial por ter medo de se expandir, e numa atitude covarde se contentam com suas vidas rotineiras sem nenhuma emoção e novas realizações, simplesmente porque o medo as paralisou e não conseguem quebrar o círculo vicioso de suas neuroses sozinhos.
O medo pode se transformar em uma doença (a fobia) quando passa a comprometer as relações sociais e a causar sofrimento psíquico. Há pessoas que não conseguem ter amigos, ficam enclausuradas em suas casas, saindo apenas para o trabalho, escola e voltando novamente para o seu “refúgio”. Tais pessoas ficam sempre a margem do envolvimento emocional. Não que as pessoas que conversam com os outros, também não tenham seus medos encobertos por uma aparência de autoconfiança. Cada vez mais a pessoas estão se defendendo dos outros e do envolvimento real.Na terapia corporal reichiana o paciente é estimulado a entrar em contato com a realidade, pois as situações atuais são afetadas pelas experiências passadas e os sentimentos ficam superpostos. O contato ocular é essencial para se reconhecer o que é real ou fantasia e para tal se utiliza técnicas que ajudam o paciente a perceber o aqui e agora, facilitando o enfrentamento das dificuldades. As fantasias são mais assustadoras do que a realidade.
José Carlos Bastos - psicólogo clínico, psicoterapeuta corporal reichiano, terapeuta comunitário
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